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Endometrite crônica

Por Dr. Murilo Oliveira

Dois fatores são determinantes para que você consiga o seu esperado teste positivo de gravidez: a qualidade do embrião (que depende da união entre um bom óvulo e um bom espermatozoide) e a receptividade uterina, ou seja, o seu útero precisa estar pronto para receber o embrião. A endometrite crônica é um inimigo silencioso, que torna o útero menos receptivo, mas existem formas de melhorar essa condição.

O endométrio, camada interna do útero, é um tecido único que passa por alterações cíclicas sob a influência dos esteroides ovarianos (estrogênio e progesterona). As mudanças nos níveis desses hormônios resultam nos múltiplos eventos biológicos do ciclo reprodutivo feminino, como menstruação, proliferação e secreção das células endometriais e decidualização (preparação para a implantação de um embrião).

Alterações morfológicas e funcionais podem deixar o endométrio inadequado e atrapalhar a implantação de embriões saudáveis. Há formas simples de melhorar a receptividade endometrial, como a adoção de bons hábitos — por exemplo: nutrição adequada, suplementação vitamínica, abstenção de álcool e tabaco, prática regular de atividades físicas e gerenciamento do estresse são condutas que melhoram a saúde de modo geral.

Realizar uma avaliação personalizada também é fundamental para descobrir se você tem alguma doença endometrial, como a endometrite crônica, que é silenciosa, mas potencialmente causadora de infertilidade. 

A endometrite crônica é um processo inflamatório do endométrio, que pode prejudicar tanto a implantação do embrião quanto a evolução da gravidez, sendo também considerada uma das causas de abortamento de repetição ou falha de implantação recorrente. Felizmente, existem métodos para diagnosticar e tratar a doença.

Causas de endometrite

A endometrite pode estar ou não relacionada à gravidez. Em muitos casos, trata-se de uma infecção pós-parto. É uma condição polimicrobiana, decorrente da ação de bactérias que migram da flora vaginal para a cavidade uterina durante o parto. É mais comum em mulheres que passam por cesariana, mas pode acometer mulheres após parto normal. Essa endometrite geralmente tem sintomas mais relevantes, que levam a mulher a procurar avaliação médica e difere da endometrite crônica relacionada à infertilidade.

Quando não está associada ao parto, a endometrite pode fazer parte de uma condição mais abrangente, chamada doença inflamatória pélvica (DIP), que também afeta outros locais do trato genital.

Os microrganismos que infectam o endométrio, geralmente, começam sua ação nos tratos vaginal ou gastrintestinal e migram para o trato reprodutivo superior. As inflamações coexistentes podem afetar: o endométrio, o colo do útero (cervicite), as tubas uterinas (salpingite), os ovários (ooforite) e o peritônio pélvico (peritonite).

Entre os microrganismos que causam endometrite crônica, estão: Chlamydia trachomatis, Neisseria gonorrhoeae, Mycoplasma, Gardnerella vaginalis, Streptococcus, entre outros. Muitos desses patógenos estão associados a infecções sexualmente transmissíveis (ISTs).

Alguns procedimentos médicos são considerados fatores de risco, pois podem facilitar a entrada dos microrganismos no útero, como:

  • curetagem pós-parto ou aborto;
  • parto prolongado;
  • cesariana;
  • histeroscopia;
  • biópsia endometrial;
  • cirurgias para tratamento de outras doenças uterinas (por exemplo, remoção de mioma, pólipo ou sinequias);
  • colocação de dispositivo intrauterino (DIU).

Sinais e sintomas de endometrite

Em sua fase aguda, que dura menos de 1 mês, a endometrite pode causar os seguintes sintomas:

  • dor no baixo abdome;
  • inchaço abdominal;
  • sangramento anormal;
  • dor pélvica;
  • dor na relação sexual;
  • corrimento vaginal atípico;
  • sensibilidade e dor à mobilização do colo do útero (no exame ginecológico);
  • febre.

Quando passa para o estágio de endometrite crônica, a doença se torna assintomática ou provoca sintomas discretos, que muitas vezes passam despercebidos. Esse caráter silencioso dificulta o diagnóstico precoce. Sendo assim, é comum que a endometrite seja diagnosticada somente após uma investigação aprofundada da infertilidade ou diante de perdas gestacionais recorrentes.

Investigação para o diagnóstico de endometrite

O ponto-chave para o diagnóstico da endometrite crônica é a investigação bem-feita. Nem sempre esse é um fator investigado no contexto da avaliação da infertilidade conjugal. A principal indicação para a investigação são casos de abortamento de repetição, falha de implantação recorrente ou suspeita pela história clínica/exame físico. 

Por se tratar, predominantemente, de uma doença com poucos sintomas e, na maioria das vezes, sintomas leves, um olhar atento e uma avaliação minuciosa podem fazer total diferença na condução do casal com dificuldade para engravidar.

O relato dos sintomas não é suficiente para fechar o diagnóstico da endometrite crônica, visto que a doença é assintomática em muitos casos. No exame físico, é possível verificar sintomas típicos de inflamação uterina, como dor e sensibilidade à mobilização do útero e presença de secreção.

Exames laboratoriais isoladamente (análises de amostras de sangue, urina e secreção cervical) nem sempre auxiliam no diagnóstico. Exames de imagem, como ultrassonografia pélvica e ressonância magnética, também podem ser solicitados para avaliar alterações estruturais no útero decorrentes da inflamação, como a presença de aderências e abscessos.

Contudo, as três formas principais de chegar ao diagnóstico de endometrite crônica são: 

  • biópsia endometrial — procedimento de coleta de fragmentos do endométrio para análise anatomopatológica, feito por raspagem ou sucção com sonda; 
  • avaliação por histeroscopia — técnica que permite a visualização direta da cavidade uterina para observar as características do endométrio, possibilitando também o procedimento de biópsia dirigida; 
  • diagnóstico genômico — uso de testes moleculares que analisam a expressão dos genes associados à receptividade endometrial e avaliam o perfil das bactérias presentes no endométrio.

Formas de tratar a endometrite

Uma vez que geralmente envolve um processo infeccioso, a endometrite crônica precisa ser tratada com antibióticos. Após esse tratamento, a fertilidade da mulher pode melhorar, embora isso também dependa de outros fatores — por exemplo, idade, reserva ovariana, condições das tubas uterinas e fertilidade do parceiro.

Em relação às condições das tubas uterinas, vale ressaltar que quem teve endometrite como parte da DIP também pode ter desenvolvido salpingite. Uma sequela da inflamação tubária é a hidrossalpinge (acúmulo de líquido e obstrução da tuba), que representa outro importante fator de infertilidade, pois dificulta a movimentação dos gametas e o transporte do embrião.

Se for necessário, é possível aumentar as chances de gravidez com a fertilização in vitro (FIV), técnica de alta complexidade da reprodução humana assistida. Antes disso, no entanto, podemos desenvolver um plano individualizado para otimizar a saúde do endométrio, aumentando a receptividade uterina para o processo de implantação do embrião.

Diferentes emoções podem surgir nessa jornada de tentativas de gravidez, como ansiedade, frustração, tristeza e medo, mas você nunca deve perder a esperança. A investigação aprofundada é o ponto de partida para diagnosticar a endometrite crônica ou outra condição que esteja retardando a realização do seu sonho. Acredite que é possível e conte com o apoio de um profissional que sabe lidar com os desafios da infertilidade!